Cada vez mais brasileiros buscam a Alemanha para dar continuidade às suas carreiras ou recomeçar numa nova profissão. Entre tantas dúvidas em relação ao processo de busca de emprego e documentação, vez ou outra alguém me pergunta lá no Instagram sobre como é trabalhar com os alemães. Todo mundo já deve ter ouvido alguém falar sobre o jeito de ser do alemão: frio, grosseiro, sem senso de humor… mas será que isso é totalmente verdade?
Pensando nisso, convidei algumas brasileiras que trabalham na Alemanha em diferentes áreas para contar um pouquinho da sua experiência e visão sobre como é trabalhar com os alemães, tanto como colegas de trabalho quanto como clientes.
Atendendo clientes alemães
Sandra – Depiladora, tem o seu próprio studio no estado de Niedersachsen
Moro há 16 anos na Alemanha, trabalhei na área de Cosméticos no Brasil por quase 20 anos como cabeleireira, maquiadora para TV, desfiles e concurso de miss. Hoje tenho meu studio de depilação, massagem e design de sobrancelha em Lüneburg. Em 5 anos de empresa posso dizer que trabalho 99% com alemães, na maioria mulheres entre 18 a 60 anos, mas tenho muitos clientes homens (o que foi surpresa para mim.
A minha experiência de trabalhar com alemão é maravilhosa, pois eles são sinceros, escrevem no Google e Facebook sobre meu trabalho me dando avaliação 5 estrelas e elogiam muito como falo alemäo (eu fingo que acredito, risos). Então eu tenho uma relação muito legal com a maioria, conversamos muito, algumas são mais caladas, mas eu adoro trabalhar com as alemãs. Elas geralmente tem pêlos mais finos e o resultado do meu trabalho é visível rapidamente.
Gabriela – Trabalha como Baby-sitter no estado de Hessen
Trabalho como baby-sitter na Alemanha há 7 meses, e tem sido uma experiência incrível. Apesar dos alemães terem a reputação de serem frios, eu nunca tive problema nenhum com eles. Pelo contrário, até foram “simpáticos”. Antes de começar o trabalho, eles foram bem sinceros e me explicaram o que eu deveria fazer e o que não deveria. E teve casos em que não gostaram de algo que fiz e falaram na cara. Pra eles isso é normal, se não gosta, fala mesmo. O brasileiro que já tem um jeitinho de falar mais com jeito. Mas por um lado isso é bom e por enquanto está dando tudo certo!
Thais – Design de sobrancelhas e micropigmentadora, atua também em Hessen
Minha experiência com os alemães me surpreendeu muito, pois logo quando cheguei na Alemanha me diziam que eles não gostavam de se cuidar e que eu não precisava falar muito alemão para atendê-los. E foi tudo ao contrário, pois a beleza para eles existe só que é de forma diferente, já que o padrão de beleza é outro. Inclusive para fazer um design ou uma Micropigmentação neles exige muita conversa, pois nosso modelo de beleza brasileiro é totalmente diferente. E que eles não gostam de conversar é outra mentira, pois adoram falar da vida deles e da vida do outro, ou seja, se não tomarmos cuidados nos metemos em fofoca igualzinho no Brasil (risos).
Então sinto que tenho que tomar o dobro do cuidado atendendo alemães, pois o conceito de beleza é outro e eu não domino a língua, por isso é perigoso não entender o que realmente eles querem.
Alemães como colegas de trabalho
Christie – Pedagoga em Niedersachsen
Estou na Alemanha há quase 3 anos e já atuei em diversas áreas pedagógicas. Por onde passei nessa minha jornada profissional atravessei desafios com os colegas. O pior deles foi no Kindergarten onde fiz meu Anerkennungsjahr (ano de validação do diploma), pois lá sofri muita humilhação. Eu nunca esquecerei de quando eu alimentava as crianças e as outras educadoras comiam também na hora do almoço e uma vez que pensei que eu também poderia comer, uma Erzieherin (cuidadora) gritou comigo dizendo que eu não podia comer daquela comida. Detalhe: todos os dias elas jogavam comida no lixo e me negaram um prato de comida. Eu engoli meu choro diversas vezes para conseguir terminar o processo de validação do meu diploma.
Posteriormente tive a oportunidade de trabalhar em um Kinderheim e lá encontrei pessoas adoráveis e generosas por quem até hoje nutro um grande carinho. Ao concluir a validação do diploma fui trabalhar no Caritas em Bremen. Aprendi muito com os treinamentos, mas também aprendi que temos que ter cuidado, porque os alemães gostam de sugar até a última gota nossas energias e pensam que somos máquinas. O estrangeiro aqui, por mais que seja melhor qualificado, é visto como „burro“ por não falar um alemão tão perfeito (ohne Akzent). Por muitas vezes tive que me impor e aos poucos estou adquirindo o respeito profissional que eu almejo. Mudar para um novo país não é fácil, temos que nos reinventar, temos que nos reafirmar quanto pessoa e quanto profissionais. A caminhada é longa e muitas vezes temos que retroceder em algumas coisas para podermos nos preparar para a grande escalada na carreira.
Jessica – Trabalha como enfermeira em um hospital em Schleswig-Holstein
Um situação curiosa que me aconteceu no trabalho, com colegas alemães foi a seguinte: para nós, brasileiros, parece muito simples em dias quentes colocar nossa água na geladeira para nos refrescarmos do calor. Mas aqui, como a maior parte do ano o clima é frio, eles não têm muita experiência com dias quentes. Estávamos sentados à mesa para a pausa em um dia bem quente, um dos poucos do ano. Eu levantei, abri a geladeira e peguei minha garrafa de água que havia colocado assim que cheguei no plantão. Meus colegas me olharam como se fosse a coisa mais genial do mundo!
Eles me olharam e falaram surpreendidos: – Nossa! Aí você bebe a água gelada? Eu disse: – Sim! No Brasil nós deixamos sempre água na geladeira! E eles ficaram com uma cara, tipo… meu Deus!
Eu achei super curioso esse fato, porque mostra justamente a diferença cultural entre os países, devido ao clima.
Relato de brasileiras que trabalham em escritório
Lívia – Gerente de operações de compras, atua em empresa da indústria química em Berlim
Eu acredito que a maioria das pessoas que vem trabalhar na Alemanha imagina que os alemães são hierárquicos, políticos, diretos, honestos, estruturados, super pontuais e não tão bem humorados. Bom, antes de vir para cá pensei em tudo isso e mais um pouco. Depois de alguns meses trabalhando com eles, eu posso dizer que algumas dessas coisas são reais, e outras não são tão assim. Eles realmente são mega hierárquicos, políticos, diretos e honestos. São também super estruturados, o que é bom em algumas situações e pode ser extremamente irritante em outras, porque eles conseguem deixar complexo até o que é extremamente simples. Precisam discutir em grupo, alinhar as opiniões, mapear riscos, identificar cenários e desenhar processos antes de tomar uma decisão ou seguir adiante com algo. Quando é uma decisão estratégica e complexa, até entendo. Mas não precisa ser assim com tudo né? Se você não tem esse estilo, prepare-se e exercite sua paciência.
Em relação a pontualidade, eu acho que varia muito. Os alemães que trabalham comigo, por exemplo, em sua grande maioria, estão sempre atrasados e correndo de reunião em reunião. Eu sou uma das mais pontuais do grupo. E o senso de humor alemão existe sim. Eu me divirto muito com eles. Já vou avisando que é um humor diferente, meio seco, ácido e sarcástico. Os que trabalham comigo são geralmente bem quietos, mas usam do humor no momento adequado e de maneira espontânea, trazendo leveza em algumas situações e até surpreendendo. Em geral, eu gosto bastante de trabalhar com eles mas venho aprendendo muito a dar tempo ao tempo, diminuir um pouco a velocidade na entrega dos resultados e a alinhar tudo e mais um pouco antes de seguir adiante. Também venho dividindo um pouco do meu estilo de trabalho com eles e tentando adicionar agilidade onde e quando necessário. Tem funcionado! Também tenho aprendido muito a ter muito mais equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Eles dão show nesse quesito!
Carol – Engenheira de Software em Berlim
Trabalhar com alemães tem sido uma experiência que tem me proporcionado um melhor equilíbrio na minha vida dentro e fora do trabalho. Os alemães valorizam e respeitam muito o tempo livre, portanto raramente há horas extras ou trabalho nos fins de semana. Das poucas vezes que trabalhei além do horário fui encorajada a encerrar minhas atividades e ir pra casa. No geral o ritmo de trabalho é bem
mais tranquilo, prazos são negociados com todos os envolvidos na tarefa. Por outro lado, vejo que a comunicação acontece de uma forma muito mais direta do que no Brasil, para nós brasileiros algumas conversas podem soar rudes num primeiro momento e isso exige um tempo de adaptação.
Izabel – Gerente de projetos e desenvolvimento de produtos na Indústria Química em Niedersachsen
Quem já ouviu falar que alemães são organizados, é verdade! Óbvio que não vou super generalizar aqui, porque já conheci alguns alemães bem desorganizados, mas depois de 10 anos trabalhando com alemães, pelo menos 90% deles tinham o total controle sobre seu tempo e trabalho. Alguns deles bem extremos, que tinham dias fixos na semana para fazer certas atividades como assinar documentos, por exemplo, e isso com o objetivo de ganhar mais eficiência e produtividade, evitando distrações durante o dia. É por isso que muitos irão dizer “não, não tenho tempo para você agora, volte em 2h” quando estão no meio de uma atividade, mesmo que você só tenha uma dúvida que pode ser resolvida com 3 minutos do tempo dele. No Brasil, pararíamos o que estamos fazendo, ajudaríamos o colega de trabalho e depois voltaríamos para a nossa atividade. Por isso achamos os alemães tão rudes. Mas fique tranquilo, não é de propósito, não é pessoal, é só o jeito alemão direto de ser. Dizer “não” e evitar distrações no trabalho é a regra.
E você, já teve a experiência de trabalhar na Alemanha? Deixe a sua opinião sobre o tema nos comentários aqui embaixo!
Quer saber mais sobre trabalhar na Alemanha? Clique aqui e acesse o portal de informações do Governo Federal alemão para mão de obra qualificada estrangeira.
1 comentário
Adorei os relatos sobre brasileiras que trabalham aqui na Alemanha e suas vivências! 🙂